Aparentemente é inimaginável fazer uma viagem de ônibus leito-cama de uma tradicional e conceituada empresa como a Viação Garcia e chegar ao destino cheio de picadas de percevejos de cama. Pois ocorreu, e não foi com apenas um passageiro, e sim com muitos, conforme relatos em uma rede social da médica maringaense Isabela Searas Veltrini, que formalizou denúncias junto à empresa e à Ouvidoria da Prefeitura de Maringá na segunda-feira passada, 17. A Viação Garcia e a Prefeitura de Maringá se manifestaram à reportagem.
A médica Isabela Searas passou a expor socialmente o problema de saúde pública depois que o seu namorado, o engenheiro civil Frederico Robles Perin, de 24 anos, chegou em Maringá, vindo de São Paulo, na manhã de sábado passado, 14, repleto de picadas de percevejos de cama. “Ele chegou se coçando todo. As feridas foram evoluindo e procuramos uma dermatologista (Dra. Ana Cecilia), que confirmou ser picadas de percevejos”, contou Isabela.
A partir da sua postagem no Instagram, Isabela Searas começou a receber uma porção de relatos de casos semelhantes ao do namorado, quase todos ilustrados com fotos, ocorridos sempre em ônibus leito-cama da Viação Garcia e em linhas diferentes, como Curitiba-Maringá e Curitiba-Paranavaí. As passagens de ônibus leito-cama nas linhas citadas custam de R$ 370,00 a R$ 460,00, dependendo do trecho e da antecedência de compra.
Um dos comentários, feito por Thaís Magalhães na rede social de Isabela, também ocorreu no fim de semana passado. Ela escreveu: “Sim, ele veio no dia 14/11 de Curitiba para Maringá e voltou no domingo dia 16/11. Nos dois trechos tinham percevejos. Entramos em contato com a empresa, mas eles ofereceram duas passagens e possível reembolso da medicação. É incrível acharem que queremos viajar com a empresa. Estamos pensando em recorrer à Justiça”.
As ocorrências semelhantes nas mesmas datas de viagens e em linhas diferentes da Viação Garcia indicam que as infestações de percevejos não se limitam a apenas um ônibus.
Outra postagem no story de Isabela diz: “Isa, a coisa aqui em casa foi tão feia que passou para todo mundo da família e tivemos que contratar duas empresas para dedetizar a casa e quase queimamos os colchões. E foi justamente por causa de uma viagem com as benções (as crianças, conforme indica o emoji da postagem), mas achei que tinha acabado”.
A narrativa da seguidora de Isabela também sugere que a infestação de percevejos em ônibus da Viação Garcia não é tão recente, a medida que ela contratou uma dedetizadora, que executou o serviço, mas não acabou com a infestação e, assim, teve que contratar uma segunda empresa.
Ilustrado com uma foto de um percevejo sobre um lençol branco, outro comentário, feito no dia 18, reforça a suspeita de que a ocorrência do inseto nos ônibus já vinha ocorrendo: “Há uma semana viemos para Curitiba de Paranavaí em ônibus leito-cama da Garcia infestado de percevejos. Estou postando agora porque muitas pessoas também passaram por isso, e muitas não sabem o motivo e acabam pensando que pode ser alergia. Eu e a Clara ficamos inteiras picadas”.
Em seu e-mail para o Departamento de Marketing da Viação Garcia, Isabela contou que recebeu diversos relatos e fotos de clientes da empresa que afirmam ter passado por situações semelhantes ao do namorado. Afirmou que, como médica, pode assegurar que se trata de uma questão de saúde pública e ressaltou que “a infecção pode se manifestar tanto de forma leve quanto evoluir para quadros graves, o que torna a situação mais preocupantes”. Os percevejos de cama não transmitem doenças.
Também solicitou que “sejam atendidos todos os casos relatados pelos clientes da companhia que passaram por situações semelhantes e sofreram prejuízos em decorrência disso”. À reportagem, Isabela disse que recebeu um telefonema da Viação Garcia. “A Viação Garcia reconheceu o problema e disse que estava trocando a empresa que faz a higienização dos ônibus”, contou a médica.
Procurada pela reportagem, a Viação Garcia informou por meio de nota que está tomando as providências necessárias para sanar o problema e se colocou à disposição para acolher os clientes. A Prefeitura de Maringá, que também foi procurada pela reportagem à medida que foi formalizada uma denúncia na Ouvidoria, informou que a demanda foi enviada à Vigilância Sanitária e ao Procon.
O que afirma a Viação Garcia
Segue, na íntegra, a nota da Viação Garcia, enviada no feriado de quinta-feira, 20.
“A Viação Garcia informa que adotou uma força-tarefa para realizar a dedetização completa de sua frota em tempo recorde de duas semanas, após passageiros reportarem a presença de percevejos em alguns de seus veículos. Mesmo com o cronograma de higienização em dia, o processo foi reforçado com a aplicação de um novo produto, já testado e com eficácia comprovada.
Segurança, conforto e higiene são prioridades absolutas da empresa, e qualquer desvio desse padrão de qualidade não é admitido.
A Viação Garcia permanece à disposição, por meio de seus canais de atendimento, para acolher eventuais clientes afetados e se compromete a solucionar qualquer ocorrência com a máxima urgência.”
O que dizem a Saúde e o Procon
Procurada, a Assessoria de Imprensa da Prefeitura de Maringá enviou, ao final da manhã desta sexta-feira,21, uma nota informando que a denúncia feita na Ouvidoria foi passada para a Secretaria Municipal de Saúde e para o Procon. Segue a nota na íntegra:
“A Secretaria de Saúde de Maringá informa que recebeu, por meio da Ouvidoria Municipal, a denúncia registrada por um passageiro sobre a possível presença de percevejos em ônibus da empresa, que tem sede em Londrina.
Conforme protocolo legal, a denúncia será encaminhada à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), órgão responsável pela regulação e fiscalização do transporte em questão, para que realize as verificações necessárias.
Caso a ANTT solicite apoio técnico, a Secretaria de Saúde realizará vistoria nos veículos e irá conferir os protocolos de higienização, desinsetização e desratização adotados pela empresa. Se identificadas inconformidades, a ANTT poderá solicitar que a empresa refaça todos os procedimentos de limpeza, higiene e segurança.
O Procon Maringá também recebeu duas denúncias sobre o caso e, com base nas normas de defesa do consumidor, notificou a empresa de ônibus para que apresente o protocolo de higienização realizado nos veículos. A empresa está no prazo para apresentar os documentos solicitados.
Os passageiros também podem realizar a denúncia diretamente para a ANTT, responsável por fiscalizar a higiene e limpeza dos ônibus, pelo telefone 166 ou WhatsApp (61) 99688-4306.”
Cinco perguntas à dermatologista
A médica dermatologista, Ana Cecilia, de Maringá e que atendeu o engenheiro civil Frederico Robles Perin no dia 14 deste mês, se dispôs a responder cinco perguntas sobre picadas de percevejos cama, enviadas por aplicativo de mensagem.
1 – Quais os sintomas que a levaram ao diagnóstico que se tratava de picadas de percevejos?
Lesões vermelhas de aspecto característico e de surgimento abrupto com coceira muito intensa.
2 – O que foi receitado ao paciente?
Medicamentos pra aliviar a coceira, de tomar e passar.
3 – Percevejos se alimentam de sangue, mas pelo que pesquisei, não transmitem doenças. Essa informação procede? E o que essas picadas podem causar?
Sim, eles não transmitem doenças.
As picadas causam um desconforto intenso devido a coceira, que pode durar até 3 semanas. Além disso, decorrente do ato de coçar pode acontecer alguma infecção bacteriana no local necessitando de outro tratamento. E toda lesão de pele pode gerar uma mancha cicatricial , mesmo depois do processo inicial ter resolvido.
4 – Atendeu outros pacientes com os mesmos sintomas que viajaram com ônibus da Viação Garcia?
Sim, atendi outras duas pacientes, no dia 22/10 e outro no dia 12/11, ambas com histórico de viagens de ônibus a São Paulo, mas eu não me recordo se foi com a Viação Garcia. Pois na época eu não suspeitava desse surto relacionado a empresa.
5 – Fique à vontade para expor eventuais conteúdos importantes que eventualmente não perguntamos e, desde já, nossos agradecimentos pela atenção.
É importante lembrar que os locais com grande circulação de pessoas, como hotéis, meios de transporte são os possíveis focos de infestação de percevejo e por isso a importância de dedetizar com frequência. O percevejo não fica alojado em nosso corpo, então a pessoa com lesões não transmite a outras.
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